o estado racista e supremacista de israel

[audiodescrição + transcrição da tradução em breve]

alexitimia em pessoas trans e em autistas

drdemonprice:

Novo estudo aponta que pessoas trans não autistas apresentam alexitimia em níveis elevados, da mesma forma que pessoas autistas.

Será que TANTO pessoas trans QUANTO pessoas autistas têm dificuldade em reconhecer seus sentimentos porque se acostumaram a se dissociar deles devido a traumas? Alexitimia é o termo clínico para a incapacidade de reconhecer ou nomear as próprias emoções. Profissionais de saúde supõem há muito tempo que pessoas autistas não são capazes de saber como se sentem, quando na realidade a maioria de nós tem sido silenciada a vida toda por sentirmos as coisas erradas. Muitas pessoas discutem a alexitimia como se fosse uma característica inata do autismo, mas esse estudo sugere que qualquer grupo que ouça que sua forma de mover e exibir o próprio corpo é “errada” pode lidar com isso se dissociando do próprio corpo e de seus estados internos. Se a alexitimia realmente for uma dissociação por efeito de traumas, podemos esperar que ela tenha uma alta taxa entre pacientes com doenças crônicas, bem como entre pessoas gordas, já que ambos os grupos também têm seus sentimentos internos invalidados em grande medida.

Infelizmente, os autores desse estudo concluem que se uma pessoa trans não consegue nomear suas emoções, pode ser que ela seja subclinicamente autista, mas isso pressupõe que a alexitimia é causada pela deficiência em vez de ser uma forma de lidar com a marginalização do próprio corpo.

ety-mologic:

Eu acredito que minhas experiências de alexitimia são tanto inatas quanto adquiridas. Sempre tive dificuldades com interocepção, o que torna "o que estou sentindo e como descrevê-lo" para lá de desafiador. Também sei que o trauma — especialmente a negligência emocional e a invalidação — contribui significativamente no porque isso é um *problema* em vez de simplesmente uma peculiaridade à qual se adaptar.

A combinação de não conseguir perceber certas sensações e não receber as ferramentas e a validação necessárias para *rotular* essas sensações resultou em uma verdadeira bagunça. Regular suas emoções é difícil ou quase impossível se você não consegue descobrir o que está sentindo (física e emocionalmente) e tem que basicamente solucionar seus sentimentos na marra. Eu de fato aprendi a rotular e comunicar melhor meus sentimentos quando consigo identificá-los, mas frequentemente ainda não os percebo, para começo de conversa (fome ou sono são exemplos de sensações básicas que geralmente não consigo “sentir” de verdade, mesmo com prática, meditação e foco intenso nas minhas sensações internas).
... Tenho pensado MUITO sobre isso ultimamente, pois estou tentando adquirir essas habilidades tanto por conta própria quanto com terapia. (A pessoa com quem faço terapia não entende de jeito nenhum que a maneira como eu vivencio sensações é diferente e se confunde com minha própria confusão em relação aos meus sentimentos, mas isso é um problema para outro dia.)

Eu não acredito que a alexitimia seja *apenas* dissociação devido a trauma ou falta de educação emocional (não que eu pense que seja isso que você está dizendo, só para deixar claro), mas acredito fortemente (e posso elaborar melhor depois) que muitos dos “sintomas” e traços que associamos ao autismo são respostas ao trauma em vez de inatos, e isso também reflete na frequência com que esses traços aparecem em outras populações estigmatizadas e vulnerabilizadas.

Vejo várias pessoas na minha vida que claramente apresentam muitos traços e aspectos de experiências autistas, mas nunca buscaram um diagnóstico ou se identificaram com um rótulo porque estão, por falta de uma expressão melhor, bem adaptadas demais. Pessoas que não sentem que há algo errado, talvez aquelas que cresceram em um ambiente de apoio ou que não internalizaram experiências estressantes como trauma, ou que conseguiram encontrar uma comunidade e um nicho em que se encaixam sem problemas na vida adulta, geralmente não procuram explicações para suas esquisitices.

(Tenho mais opiniões a respeito de, sei lá, será que somos particularmente suscetíveis a processar níveis "normais" de estresse como traumáticos? Sei que muitas das minhas Memórias Ruins formativas são coisas completamente normais que outras pessoas com quem conversei também viveram e não tiveram problemas duradouros. Mudando um pouco de assunto e falando mais pessoalmente, será que existe alguma razão de eu ser capaz de identificar rótulos emocionais mais granulares, como “frustração”, “desespero” e “contentamento”, mas NÃO os rótulos chamados de basilares, como “raiva”, “tristeza” e “alegria”, que sempre me pareceram vagos e indetermináveis demais?)

ety-mologic:

Um adendo: sempre que penso no papel que a invalidação possui em nossas experiências, lembro de um texto chamado "Scarred", e fico com a frase específica "Essas cenouras estão muito apimentadas" ecoando na minha mente.

Estamos acostumados a ignorar nossos próprios corpos. "Essas cenouras estão muito apimentadas", reclamávamos quando crianças, apenas para ouvir que não, elas estavam doces, que a música não estava alta demais, que ninguém é capaz de ouvir as luzes, o que você está sentindo é inválido. Ouvimos: você é inválido. Você não vivencia o mundo da mesma forma que os outros e, portanto, sua experiência está errada.

"você fez sua namorada sentir vergonha de ser gorda"

Pergunta: Minha namorada e eu nos relacionamos há alguns anos. Nos últimos tempos ela engordou muito e tem sofrido bastante com isso. Ela não gosta da própria aparência, suas roupas não servem mais e ela odeia se arrumar de manhã, sendo que costumava adorar moda.

No meio disso tudo, tenho tentado oferecer o máximo de apoio e amor possível. Eu digo a ela como é linda e o quanto eu a amo e a incentivei a comprar roupas novas em que ela se sinta bem. Ela admite que está sempre comendo em excesso e não pratica exercícios o suficiente, então tentei apoiá-la a ajustar seu estilo de vida preparando refeições mais saudáveis em casa e fazendo matrícula numa academia. Mas velhos hábitos são difíceis de abandonar e essas mudanças não pegaram de verdade.

Isso vem acontecendo faz nove meses e ela continua engordando. E apesar de eu me autoproclamar uma pessoa positiva em relação ao corpo, seguir pessoas gordas ativistas nas redes sociais e me esforçar pra combater a gordofobia que aprendi ao longo da vida, a verdade é que tem horas em que sinto saudade da aparência dela quando nos conhecemos pela primeira vez. E tenho muita vergonha disso. Me sinto horrível como pessoa e ativista.

É claro que não contei isso a ela, porque tenho vergonha e não quero que ela se sinta mal consigo mesma. Mas nossa intimidade enfraqueceu ultimamente, e ela é tão insegura quanto a ter engordado que o tempo todo me pede validação, o que eu dou. Esses dias ela me perguntou diretamente se sinto menos atração por ela agora do que quando nos conhecemos. Não fui capaz de mentir na frente dela, então falei que sim.

Obviamente, ela ficou arrasada. E agora eu me sinto ainda pior e com mais vergonha. Me sinto hipócrita e uma pessoa horrível.

Acho que minha pergunta é: como faço para reacender um pouco dessa atração física? Como posso ser alguém menos babaca e gordofóbico? E foi errado da minha parte falar honestamente sobre como me sinto?


Resposta: Admirei você ter escrito para essa publicação em particular pedindo ajuda para lidar com a sua situação. E vou levar a sério o que você disse sobre querer um conselho real, e não um papinho motivacional para se sentir melhor. Para falar a verdade, o que vou escrever não vai te fazer sentir nem um pouco melhor. Sei disso porque sua carta é majoritariamente sobre como você se sente. Sobre como o peso da sua namorada faz você se sentir sobre si mesmo como ativista, sobre como o peso da sua namorada faz você se sentir sobre suas dificuldades como pessoa aspirante a aliada da positividade em relação a corpos gordos, sobre como você disse uma coisa terrível para sua namorada e agora você se sente “com vergonha”, “horrível” e “babaca”. A única coisa que sei de fato sobre sua namorada é que ela “engordou muito” (seja lá o que isso significa para você) e foi do sofrimento à desolação por causa de como você reagiu diante isso.

... Ao mesmo tempo que ouço que você incentivou sua namorada a comer de forma mais saudável e ir à academia, não ouço nada sobre os infinitos outros fatores que influencinam o peso de uma pessoa. Tais quais genética, idade, hormônios, histórico familiar, metabolismo, saúde mental, stress, pressão social, medicamentos, sua relação com traumas, abusos ou negligências do passado, seu histórico com comida e exercícios, as mensagens internalizadas sobre essas coisas ao longo do crescimento, se ela é perfeccionista ou não, quais as demandas em sua vida, tempo e corpo além de “dieta e exercício físico”, qual sua situação financeira, se ela tem alguma aversão ou sensibilidade alimentar ou não, como a pandemia a afetou. Eu poderia continuar sem parar e perguntar um bilhão de outras perguntas sobre sua namorada, porque o peso de uma pessoa quase nunca tem a ver somente com sua força de vontade para comer vegetais e suar numa bicicleta ergométrica; é um nó confuso e emaranhado de fatores físicos, mentais, financeiros, emocionais e sociais que é quase impossível de desatar. Tentar aprender de fato como essas coisas se entrecruzam e descobrir como quaisquer delas podem ter afetado sua namorada seria um uso muito melhor do seu tempo do que seguir pessoas gordas ativistas nas redes sociais.

Vou ser 100% honesta: se sua namorada escrevesse para essa coluna com essa história, eu diria para ela terminar com você. Não porque você “falou honestamente sobre como se sente”, mas porque ganhar ou perder peso, de novo e de novo e de novo, é parte da vida de quase todo mundo. É algo totalmente insignificante na vasta tapeçaria da existência, e se engordar no período curto de nove meses te joga nesse tipo de espiral em que você não apenas sente menos atração por ela, como também se considera na obrigação honrosa de dizer isso a ela, como você vai dar conta de quando as coisas realmente difíceis acontecerem? Quando um de vocês adoecer ou adquirir uma deficiência? Quando um de vocês for consumido por um luto aparentemente sem fim após a morte de um ente querido? Quando um de vocês perder o emprego? Quando problemas financeiros chegarem? Quando perderem sua casa? Quando um de vocês desenterrar um trauma que escondeu até de si mesmo? Quando um de vocês for incapaz de se libertar da densa névoa da depressão ou ansiedade? Quando um de vocês sofrer um acidente? Quando seus corpos simplesmente envelhecerem, como acontece com todos os corpos?

Por que sua namorada te confiaria a felicidade futura dela, com os fardos e alegrias de comprar uma casa ou ter crianças, com a bênção de amá-la por tanto tempo que a verá envelhecer como a avó dela, se simplesmente engordar fará com que você diga algo que sabe que vai deixá-la arrasada? Algo que você sabe que vai afetar a autopercepção dela pelo resto da sua vida? Toda vez que você iniciar uma transa, toda vez que você entrar no banheiro enquanto ela toma banho, toda vez que ela trocar de roupa na sua frente, toda vez que você tentar dizer algo legal sobre ela ou sua maquiagem ou roupa, ela terá que enfrentar o fato de que você disse que ela não era mais atraente.

Parece que o jeito que você se percebe está no centro do seu processo de decisões no momento, então deixe-me perguntar: por que você não sente tanta atração por sua namorada quanto quando vocês se conheceram? Será mesmo que é porque o corpo dela está com uma forma diferente ou é porque você se preocupa com o que uma sociedade gordofóbica vai projetar sobre você por estar com ela? Será que você agravou as inseguranças de sua namorada projetando suas próprias inseguranças sobre ela?

E aqui vai algo que você precisa encarar com uma honestidade extra, porque vai revelar algo profundamente importante sobre quem você é: você sabia que iria arrasá-la, sabia que seria cruel, sabia o que aquelas pessoas gordas ativistas diriam sobre isso. Você já se educou o suficiente para saber exatamente o que estava fazendo, e mesmo assim foi em frente e disse à sua namorada que ela não é mais atraente para você. Por quê? Sério, por quê? Você fez os cálculos mentais naquele momento e decidiu que a vergonha e a dor que sabia estar infligindo a ela valiam a pena, se isso fizesse sua namorada voltar ao tamanho que você quer que ela tenha?

Você pediu conselhos práticos, então aqui está: comece por sua própria pessoa. Trabalhe em quem você é. Não estou falando em curtir fotos de pessoas gordas yogis e citações positivas sobre corpo no Twitter. Estou falando de tentar realmente entender o que contribui para determinar o peso de uma pessoa e realmente buscar conhecimento sobre como é habitar o mundo como uma pessoa que não é magra, e mais do que tudo, entender por que você reagiu à sua namorada desse jeito. Se for para restaurar a intimidade de vocês, vai ter que começar com você fazendo um trabalho duro na sua própria pessoa e aprendendo a valorizar os sentimentos de sua namorada em relação a seu próprio corpo. Vai ter que começar com você se preocupando menos com como as pessoas percebem seu ativismo e mais com o que está acontecendo na mente e no coração de sua namorada.

Tenho fontes seguras para dizer que estes são alguns bons livros para começar sua jornada em ser alguém melhor, incluindo textos educativos e memórias: Belly of the Beast: The Politics of Anti-Fatness as Anti-Blackness, de Da’Shaun Harrison; Shame Is an Ocean I Swim Across: Poems, de Mary Lambert; Heavy: An American Memoir, de Kiese Laymon; qualquer coisa/tudo que Samantha Irby produziu; Fat and Queer: An Anthology of Queer and Trans Bodies and Lives. E quanto a podcasts, um bom para iniciantes é o Maintenance Phase e um mais radical é o Unsolicited: Fatties Talk Back.

Vou encerrar com uma história sobre minha própria jornada pessoal em relação a dieta e exercícios. Na verdade, ganhei bastante peso desde o início da pandemia, em grande parte por causa da Covid Longa e dos medicamentos que preciso tomar para controlá-la, além do fato de que estive praticamente confinada à minha casa por mais de dois anos. Sofri com o impacto disso em como me sinto sobre mim mesma, mas ao longo do processo dessas dificuldades, minha esposa e eu nos aproximamos mais ainda e nossa intimidade se aprofundou para além das minhas imaginações mais ousadas. Não porque eu engordei, mas porque meu aumento de peso não diminuiu em nada o afeto ou atração dela por mim. Quando eu perguntava e perguntava e perguntava, ela reafirmava de novo e de novo e de novo que me amava, que eu era a melhor pessoa do mundo, independente do tamanho das minhas roupas, que ela desejava me amar e beijar independente do que a balança mostrava, que ela entendia minhas inseguranças e que elas eram válidas, mas que meu corpo é apenas a carapaça que me mantém viva por dentro e que tudo que importa para ela é que ainda sou eu mesma aqui dentro. O processo de me tornar tão vulnerável em relação às minhas inseguranças e não receber nada além de afirmação curou algo dentro de mim que eu nem sabia que estava me machucando.

Hoje de manhã, voltei para casa depois de andar de bicicleta, coberta de suor, poeira de estrada e chuva. Minha esposa me agarrou e me beijou toda boba. Eu disse: “Você gosta de como fico nessa roupa de ciclismo”. Ela disse: “Nada me faz mais feliz do que sua felicidade, e nada te deixa mais feliz do que estar em sua bicicleta”. Eu quase desisti de pedalar depois que comecei a me recuperar da Covid Longa porque eu me sentia uma salsicha embutida nas minhas roupas de ciclismo de lycra, mas minha esposa me incentivou a comprar roupas que me servissem melhor. Então eu o fiz, e minha recompensa foi reconquistar meu hobby favorito e receber um monte de beijos por isso.

Todo mundo merece algo assim. Eu, sua namorada e todas as zilhões de outras pessoas no mundo cujo peso é apenas uma das miríades de coisas que sempre estarão em fluxo nas nossas incríveis vidas únicas e preciosas.