"do mal"?
- original: @nurse.conner (tiktok)
- republicações: tiktok, instagram
[audiodescrição introdutória em breve]
Quando as pessoas discutem as atrocidades que estão sendo cometidas pelas forças de ocupação contra o povo de Gaza, você escuta a palavra "maligno" sendo dita por aí. E, na verdade, não gosto do jeito que usamos essa palavra.
Preste muita atenção quando você a ouvir e como ela está sendo invocada. As pessoas falam sobre o mal quase como se fosse algo sobrenatural. Falam como se fosse uma força primordial incontrolável e onipresente à qual os humanos não têm poder para ser mais que um canal, e que é apenas uma questão de quando e onde.
Eu acho que isso é um erro por diversos motivos, que se resumem à desumanização das pessoas que estão perpetuando essas atrocidades. Liberais vão me ouvir mal quando eu disser isso, tipo, "ah, sim, humanizem criminosos de guerra, vocês têm mesmo é que sentar em volta de uma fogueira e cantar uma música ou algo do tipo"; não estou dizendo nada disso, mas sim que você tem que se forçar a entender que essas atrocidades estão sendo cometidas por mãos e pessoas humanas.
Isso é importante porque só seres humanos são capazes de responder por suas ações. Satanás ou a força do mal ou o bicho-papão ou sei lá não pode ser responsabilizado. As Forças de Ataque de Israel com certeza podem.
E mais ainda, acho perigoso criar uma distância entre si próprio e as pessoas que estão cometendo esses atos horríveis, porque é assim que eles são capazes de serem cometidos em primeiro lugar. Você vê corpos sendo explodidos e seu cérebro não consegue compreender a desumanidade, e diz "não, isso é um Outro maligno alienígena e não tem nada a ver comigo", mas tem tudo a ver com você, porque se seres humanos do outro lado do mundo podem ser influenciados por seu Estado a fazer tais coisas, você também pode. Entidades políticas mal-intencionadas se aproveitam de motivações humanas para fazer com que pessoas façam coisas terríveis em seu nome.
Se você desumaniza as pessoas que cometem esses atos, você perde isso de vista. Abaixe o espelho, pois você deveria estar dando uma boa olhada nele. Suas motivações também podem ser distorcidas pelo Estado para fins malignos. Qualquer superioridade moral ou separação que você sinta desse fato é apenas consequência das circunstâncias. Estamos sobre terras roubadas também.
Quando você se separa da sua capacidade de fazer o mal, você tira o dedo do coração da sua humanidade. É assim que um grupo de pessoas que sofreu genocídio pode vir a cometer um. Quando você trata o opressor como um outro, você não consegue identificar que se tornou ele.
Usamos o mal como um recurso retórico para nos distanciar das partes feias e assustadoras da humanidade que não gostamos de ver no espelho. Acho que, especialmente para estadunidenses, isso é um erro enorme. A realidade incômoda é que você não está separado disso, você está muito mais próximo disso do que talvez se permita admitir. Você vê o que está acontecendo lá e diz "isso é diabólico, isso é Maldade com letra maiúscula", quando a palavra que procura de fato é Americano com letra maiúscula. [interjeição] Oops!
Israelenses não são sobrenaturalmente malvados, Netanyahu não é o Voldemort. Eles são parte de um projeto de ocupação colonial cujo manual os EUA ajudou a escrever. Não ouse se separar disso, ainda mais quando você o está financiando. Acho que o quão perto você está do mal do qual você tenta se distanciar é o que mais te assusta. A chamada está vindo de dentro de casa e essa é a realidade com a qual é tão vital lidar.